Resenha
I, Daniel Blake é um filme do cineasta Ken Loach e seu roteirista
Paul Lavert, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes em 2016.
O filme é uma
janela que nos permite olhar em diferentes perspectivas e refletir sobre o
abismo estabelecido na relação dos trabalhadores e do Estado.
O Estado ao
agregar o domínio das funções políticas, sociais e econômicas aliadas aos
Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário defende a ideologia da busca pelo
bem estar comum, pela harmonia social, isto é, o acesso igualitário dos
cidadãos à saúde, educação, moradia, justiça, defesa, Seguridade Social.
Esse discurso é
confrontado e desconstruído a partir da apresentação das histórias dos
trabalhadores Daniel Blake, Katie e os vizinhos de Daniel.
A história
desses personagens se passa em Newcastle, norte da Inglaterra, um país que se
distingue do Brasil e de outros países pobres por ser desenvolvido, ou seja,
possuir um elevado grau de industrialização, reduzida dependência financeira,
associado a um bom padrão de vida de seus cidadãos. No entanto, Daniel, um
carpinteiro, viúvo, após sofrer um ataque cardíaco e encontrar-se
impossibilitado de retomar suas funções laborais vê-se no labirinto kafkiano ao
buscar o auxílio da Previdência Social. A trama deixa evidente para o público
que o Estado, seja em países desenvolvidos ou subdesenvolvidos, é criado para
dificultar, suprimir, sepultar o acesso das classes trabalhadoras aos seus
direitos.
Marx afirma que
o Estado é fundamentalmente classista, isto é, representa uma classe e não o
corpus social em sua integralidade: “o poder político do Estado representativo
moderno nada mais é do que um comitê para administrar os negócios comuns de
toda a classe burguesa”.
Para Marx, o
Estado defende os interesses dos donos dos meios de produção por meio das
instituições e dos seus instrumentos de regulação: sistema jurídico e policial.
Nesse sentido,
Daniel Blake, Katie e os imigrantes, vizinhos de Daniel, representam toda a
classe trabalhadora subjugada pelo sistema capitalista, os quais estão numa
situação de extrema vulnerabilidade social. Como afirma Gilberto Dimenstein são
os cidadãos de papel, quer dizer, têm direitos adquiridos, mas não conseguem
gozar dos mesmos em decorrência da burocracia das instituições, da
desinformação, da organização de um Estado estruturado para a prática dos
interesses dos donos dos meios de produção.
Através da emancipação da
propriedade privada em relação à comunidade, o Estado adquiriu uma existência
particular, ao lado e fora da sociedade civil; mas este Estado não é mais do
que a forma de organização que os burgueses necessariamente adotam, tanto no
interior como no exterior, para garantir recíproca de sua propriedade e de seus
interesses (MARX, 1993, p.98).
Esse filme
desperta a empatia, a sensibilidade, a indignação, o incômodo ao retratar sem
exageros realidades tão comuns, globais como a de Katie (Hayley Squires), a
qual estava numa situação tão delicada quanto a de Daniel, ambos se conhecem na
Agência da Previdência Social. Daniel apesar de suas limitações financeiras e
físicas estende a mão de solidariedade a Katie, ajudando, prestando pequenos
serviços, sem visar outros interesses, mas pautado no prazer de servir, de
colaborar para o bem estar do outro, Kafka afirma que “a solidariedade é o
sentimento que melhor expressa o respeito pela dignidade humana”. Contudo, bem
sabemos, que no sistema capitalista, dominado pelos donos dos meios de
produção, a dignidade humana é a matéria mais escassa.
katie, mãe
solteira, com dois filhos, é jogada pelo Serviço Social de Londres para
Newcastle. Perdida, sem dinheiro, sem emprego, sem amparo, longe da família,
desejava retomar os estudos, mas não consegue acessar seus direitos na
Previdência Social, não obtém uma colocação no mercado de trabalho e sequer tem
comida para suprir suas necessidades diárias, o desejo de estudar, de voltar
aos livros torna-se distante, inacessível, as imposições do sistema
entrincheirava o percurso de Katie em direção à educação.
Os vizinhos de
Daniel Blake são exemplos da relação escravista que se estabelece com os
imigrantes, eles acabam se arriscando na ilegalidade de um comércio autônomo
para se não se submeterem a uma situação de quase escravidão.
O filme I,
Daniel Blake inquieta, perturba pela densidade das relações retratadas e das
reflexões propostas.
Referências Bibliográficas
MARX, Karl. A ideologia alemã. 9º
ed. São Paulo: Hucitec, 1993
Assista ao trailer:
Oi Fabi, que coincidência, também farei uma análise do filme de Daniel Blake. Estou finalizando, na verdade um pouco tardia, mas logo depois que assisti o filme imaginei uma postagem no blog. Depois visita o meu blog e dá uma olhada. Bjos
ResponderExcluirKali
ExcluirLegal, fiquei curioso em ver o filme. Qual a relação vc achou entre o que é retratado e a nossa realidade? Qual influência é mais predominante: o sistema financeiro/empregador sobre o sistema educacional ou o contrário?
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